Os dicionários definem muro como algo que separa ambientes e ponte como aquilo que permite a aproximação de espaços, liga, une.
O município de Paulo Afonso, desde quando ainda era um inexpressivo povoado chamado Forquilha pertencente ao município de Glória e por ele esquecido no meio da caatinga, convive com estas duas realidades até hoje.
Primeiro, ao se instalar nestas terras sertanejas, a Chesf optou em fazer um enorme cerca de arame farpado de cerca de um quilômetro de extensão para separar a sua área de escritórios e residencial dos que moravam, de forma miserável no então Povoado Forquilha que depois ficou ainda mais conhecido como Vila Poty, porque os barracos das milhares de pessoas que iam chegando ao local à busca de trabalho na Chesf, eram forrados e cobertos com os sacos vazios do cimento desta marca, utilizado pela Chesf em suas obras.
Mais adiante, observaram que a cerca de arame não oferecia a segurança que se queria dentro da área do Acampamento, a cidade da Chesf e fez-se, no lugar da cerca, um muro de pedra e, no seu topo, mais uma cerca de arame farpado.
O muro da Chesf deu muito o que falar. Foi estímulo que impulsionou a campanha para a emancipação política de Paulo Afonso. Mas, mesmo emancipado como município baiano, Paulo Afonso continuou em total dependência da Chesf que se tornou a provedora das condições de sobrevivência dos seus moradores. No seu ritmo.
Instalou chafarizes para melhorar o acesso à água para os moradores da Vila Poty mas manteve, dentro de sua área de jurisdição, os serviços essenciais como hospital, escolas, clubes sociais, igreja, mercado público, feira livre, por muitos anos. A energia elétrica na Vila Poty só chegou em 1960. Os prefeitos de Paulo Afonso continuaram sendo indicados ou ligados à Chesf: Otaviano, Adauto Pereira, Edson Teixeira, José Rodrigues de Figueiredo...
Só nos anos de 1980, na gestão do Prefeito Abel Barbosa que encontrou no presidente da Chesf, Rubem Vaz da Costa, um respeitoso amigo, o muro da Chesf foi camuflado, com a construção de uma rua comercial ao longo do seu percurso. Mas ele continua lá...
Quanto às pontes, esse foi outro atropelo na vida dos moradores de Paulo Afonso. Para se chegar a Forquilha/Vila Poty/Distrito de Paulo Afonso, até o ano de 1958, ano de sua emancipação, só havia dois caminhos: os que vinham de Salvador tinham que enfrentar estradas muito ruins, por centenas de quilômetros e durante muitos anos. Os que vinham de outros estados nordestinos chegavam através de Petrolândia/PE onde atravessavam o rio São Francisco em grandes balsas até a cidade de Glória e dali, percorriam cerca de 30 quilômetros em estradas carroçáveis até Paulo Afonso.
Foi assim que meus pais, eu, com quase 7 anos e meu irmão José, com 4 anos, chegamos, de pau-de-arara, a Paulo Afonso em 20 de novembro de 1954.
Um projeto de construção da Ponte Metálica D. Pedro II havia sido iniciado no início dos anos de 1950 mas estava parado há anos e só foi concluída no governo do presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira que prometeu concluir essa obra em seu governo, se eleito fosse, respondendo a uma cobrança de Aparício, que no meio de uma multidão que assistia o comício improvisado por Abel Barbosa para atender ao candidato Juscelino. Reiniciada em 1957, esta ponte, feitas dos mesmos ferros franceses utilizados na construção da Torre Eiffel de Paris, foi inaugurada em 1958.
Cerca de 20 anos depois, a Chesf em ampla expansão de suas obras, sentiu a necessidade de criar mais uma grande usina hidrelétrica, a Usina Paulo Afonso 4 e, por recomendações técnicas e melhor aproveitamento das águas do rio São Francisco, decidiu-se fazer o Canal da Usina PA-4 que transformou toda a parte histórica da cidade de Paulo Afonso e todo o Acampamento, hoje Bairro da Chesf, até o espaço de sua grandes usinas, numa grande ilha.
Para o livre trânsito de pessoas e veículos, a Chesf construiu a Ponte do PCTRAN, na entrada da Ilha de Paulo Afonso, nos idos dos anos de 1970.
Na época, exatamente para construir esse canal, a Chesf deslocou algumas famílias que moravam no eixo desse canal e as transferiu, num processo muito doloroso, para o local conhecido como Mulungu, o embrião do Bairro Tancredo Neves.
Por esse tempo, a população de Paulo Afonso se concentrava basicamente no espaço da Ilha – na Vila Poty, Bairro Centenário, Bairro Amaury Menezes (BNH) e na área da Chesf.
A ponte então, como foi projetada, na visão dos técnicos da época, atendia às necessidades do município. Ao que parece, ninguém fez um estudo sobre as possibilidades de crescimento da cidade de Paulo Afonso ou se fez pouco caso disso e todos se conformaram com a Ponte do PCTRAN.
À medida que as populações de fora do espaço da Ilha de Paulo Afonso foram crescendo e nascendo bairros fora da Ilha, e foi construído também o aeroporto, e o Bairro Tancredo Neves teve um crescimento fantástico e hoje tem uma população bem maior que a da Ilha, estimada em 45, 50 mil pessoas, começou a se ver que a Ponte do PCTRAN precisava de urgentes melhorias ou ampliações.
No governo do prefeito Raimundo Caires alguém teve a ideia de se fazer uma passarela em suas laterais para fluxo de pedestres porque a ponte estava acima, bem acima do seu limite de capacidade. O projeto se mostrou desastroso e foi condenado por especialistas que viram, inclusive, a possibilidade dos cabos de sustentação da ponte virem a ser atingidos com a fixação desta passarela e a ponte cair. Simples assim.
Em dezembro de 2009, o então prefeito Anilton Bastos agendou uma reunião com o Presidente da Chesf, na época, Dilton da Conti, na sede da hidrelétrica, no Recife. O prefeito Anilton, que estava em Salvador, seguiu dali acompanhado do Deputado Federal José Carlos Aleluia e do Deputado Estadual Luiz de Deus.
De Paulo Afonso eu, que era Assessor de Comunicação mas também atuando na área do Turismo, segui acompanhado da Secretária de Planejamento, Patrícia Alcântara e levamos dois pedidos de apoio à Chesf para Paulo Afonso. Eu, defendi uma parceria da hidrelétrica, que possuía na época um Departamento de Meio Ambiente, para limpeza dos lagos do Acampamento da empresa. A Secretária de Planejamento levou um pedido de apoio da Chesf para melhorias ou duplicação da Ponte do PCTRAN, construída pela Chesf, sem a previsão do aumento de fluxo por essa ponte em face do grande crescimento da população de Paulo Afonso.
O presidente da Chesf nos recebeu de forma educada mas friamente. Recebeu as nossas propostas. Não fez promessas e o assunto morreu naquela reunião.
As atenções para resolver esse problema se aceleraram quando, em uma Copa Velas, a ponte do PCTRAN estava com vários trios elétricos e oscilou muito.
Recorreu-se então ao Ministro das Cidades, Mário Negromonte, que possui residência na Avenida Apolônio Sales. Embora politicamente separados, o Prefeito Anilton Bastos, acompanhado do Vice-Prefeito Flávio Henrique estiveram no gabinete do ministro, em Brasília e ali deixaram o pedido de duplicação dessa ponte. Nada se fez.
Recorreu-se então ao Governador Rui Costa, da Bahia. Ele prometeu fazer essa duplicação, chegou a anunciar uma licitação para que esse projeto fosse realizado, foi até escolhida a área onde seria construída a nossa ponte e, depois de muitos anos de promessas e desculpas, nada se tem de definitivo sobre a nossa ponte do PCTRAN. Na época, o assunto até causou ciumeiras nos jequieenses, que também pleiteavam a construção de uma segunda ponte por lá, como noticiou o site acima. (Leia a matéria nesse link:
https://www.jequiereporter.com.br/blog/2016/01/12 - )
Há algum tempo que o vereador Marconi Daniel tem alertado a gestão municipal para que trabalhos de melhoria nessa ponte sejam realizados, tais como o aumento do guarda corpo que, como foi criado e permanece hoje, por ser muito baixo, traz grande insegurança para os pedestres que precisam transitar por essa ponte diariamente, ao lado de carretas, ônibus, veículos pequenos, carroças de atração animal, motos e bicicletas, num fluxo intenso e cada vez mais crescente.
Recentemente, a vereadora Evinha de Oliveira, voltou a este assunto, em uma sessão da Câmara Municipal lembrando que essas condições da ponte têm permitido que muitas pessoas busquem o suicídio nela, como já aconteceu várias vezes, se bem que os distúrbios que levam uma pessoa a esse ato extremo não estão associados a um determinado ambiente mas, se houver maior dificuldade para que isso aconteça, melhor.
Esse relato sobre Muros e Pontes de Paulo Afonso, talvez enfadonho para alguns, é mais um grito de alerta para que os gestores do município e do Estado da Bahia, os deputados que se dizem representantes de Paulo Afonso despertem para esses cuidados e que as promessas de campanha, que sempre se repetem, sejam levadas a sério pelos senhores candidatos a deputados, senadores, governador, que todos os anos levam milhares de votos dos pauloafonsinos.
Até porque, senhoras e senhores, os dois outros caminhos de saída da Ilha de Paulo Afonso são os acessos pelas usinas da Chesf, privativos da hidrelétrica e fechados ao público há muito tempo. Se ficarmos sem essa ponte, pra sair da Ilha, infelizmente, essa saída só será possível a nado ou de barco, pelo Canal de PA-IV como era antigamente de Petrolândia para Glória, pra se chegar em Paulo Afonso.
Em 2022 acontece uma nova eleição e é muito importante que as ações de fato aconteçam, antes dessas eleições ou teremos, como sempre acontece, apenas promessas vazias, discursos bonitos, até lágrimas e se continua com a enrolação que se repete há dezenas de anos...
Infelizmente, têm sido tantas as promessas mentirosas que precisamos, em se tratando de humanos seres, precisamos fazer como São Tomé: vai ser preciso ver primeiro, para crer.
LEIA MAIS:
Ponte de acesso à ilha de Paulo Afonso será ampliada
https://pa4.com.br/noticias/ - 31 de janeiro de 2008 às 17:29
Prefeito de Paulo Afonso entrega
projetos ao Presidente da Chesf
jornal Folha
Sertaneja Nº 70, Dez/2009 – Jan/2010
https://www.jequiereporter.com.br/blog/2016/01/12
Paulo Afonso precisa de um olhar mais amoroso; a nossa cidade é linda demais, enche os olhos de quem chega aqui e não cansa os nossos. As nossas pontes inspiram insegurança.
Aquela foto da feira tem 71 anos. Alguém de 20 anos teria ou terá hoje 91 anos. Algum vivo? Algum que alguém identifique? Gostaríamos de saber.
No texto anterior quis dizer ...da cerca da vergonha...Galdino parabéns pelo jornal. Cada vez mais surpreendente.
Belíssima matéria sobre a nossa querida Paulo Afonso. Também cheguei a PA na década de cinquenta e tenho muita história pra contar sobre a evolução da cidade, antes só pedra e poeira na Vila Poty, hoje um bairro socializado e pujante bem diferente dos tempos da vergonha. Em Paulo Afonso eu e meus irmãos tivemos uma infância e uma adolescência como poucos tiveram na vida.