Cheguei a Paulo Afonso, que ainda era o Povoado Forquilha, menino, com menos de 7 anos, com os meus pais e fiquei espantado, boquiaberto mesmo, com tanta água ao ter que atravessar, nós todos e os caminhões paus-de-arara, a imensidão das águas do rio São Francisco, de Petrolândia/PE para Glória/BA, para chegar a Paulo Afonso. Era o dia 20 de novembro de 1954.

Nesses 69 anos, foram milhares de contatos com esse rio, suas cachoeiras, seu cânion, todo o baixo São Francisco, de Piranhas a Piaçabuçu/AL e sua foz. Seus lagos imensos, como o de Moxotó e Itaparica e outros e seus pequenos e poéticos lagos com o do Touro e Sucuri e o do Capuxu e os muitos outros, hoje abandonados e esquecidos, como a Lagoa dos Patos...

E, todos os anos sempre dava um jeito de ver os barcos na procissão de São Francisco, na festa do padroeiro da cidade.

Por muito tempo, essa procissão aconteceu no Lago Delmiro Gouveia, saindo os barcos do Porto Bahia, ao lado do Obelisco que marca o início da construção da barragem pioneira da Chesf.

Depois, foi um contentamento geral quando a procissão começou a ser feita no Canal do Lago de Moxotó, conhecido como Canal da Usina Paulo Afonso 4, tendo como cenário o grande lago/mar de Moxotó, com um bilhão e 200 milhões de metros cúbicos de água...

Procissão fluvial em Paulo Afonso no ano de 2022

Eram muitos barcos, tendo à frente o catamarã que conduzia a imagem de São Francisco, autoridades da Igreja Católica e alguns convidados. No ano de 2022 já se notava uma menor quantidade de barcos mas ainda convincente. O cenário é belíssimo, de todos os ângulos, principalmente de cima da ponte do Canal.

No local da saída dos barcos, que nunca mereceu uma atenção especial, e nesse espaço, desde os tempos do Prefeito Paulo de Deus, já se falava num Projeto chamado Orla do Canal – uma ideia que está no papel há mais de 20 anos – ali, uma pequena multidão esperava a chegada da imagem do santo que vinha, numa carreata saída da Igreja de São Francisco. Ali vi, muitas vezes, autoridades, empresários, com as vestes do santo, devotos, esperando a sua chegada e acompanhando o trajeto, pelas águas, até a Prainha de Paulo Afonso.

É verdade que “santo de casa não obra milagre” e que como muitos se fazem de ouvidos moucos, fica-se às vezes pregando no deserto, quando se ousa sugerir alguma ação ao município...

Procissão fluvial em Paulo Afonso no ano de 2023

A pequena quantidade de público no local da saída dos barcos e os poucos barcos da procissão fluvial foram decepcionantes. E porque isso está acontecendo? Perguntava um senhor, incrédulo com o que via à sua frente... 

- Também gostaria de saber, senhor...

A Procissão Fluvial de São Francisco em Paulo Afonso era para ser um dos maiores eventos para a atração de turistas para esse lugar, como o é em outros lugares onde eventos semelhantes são realizados. Há, independente da crença religiosa, uma grande atratividade para o visual, o cenário belíssimo de embarcações, dos mais variados tipos, singrando sobre as águas calmas de rios e de lagos ou do mar imenso.

Mas, em Paulo Afonso, como se vê, apesar do grande esforço alegado pela Diocese, falta, não só o apoio logístico da Prefeitura. Falta mais, falta a visão estratégica e política dos gestores municipais para transformar as muitas águas que formam a Ilha de Paulo Afonso em atrativos que tragam visitantes e, com isso se fortaleça a economia local.

Conversando com o cinegrafista José Carlos Ferreira que já produziu muitas imagens grandiosas para a programação da TV São Francisco, do grupo da Rede Globo, vimos como está sendo decepcionante, a cada ano esse grande evento.

Este ano, imagens de drones mostram que a carreata, que todos os anos reunia dezenas de veículos e normalmente já havia uma pequena multidão no local, esteve menor. E o grande número de pessoas que se concentravam no local da saída dos barcos, muitos deles, adultos e crianças com as vestes de São Francisco, entre eles até autoridades municipais, este ano foi bem pequeno, como mostram estas imagens... Uma pena!  

A cada ano, tem sido menor a quantidade de barcos. Ultimamente, apareceram alguns poucos jetskys onde os pilotos pareciam apenas se divertir e não fazer parte de um cortejo religioso...

As imagens de drones que José Carlos fez mostram um evento tão pequeno que não o animaram a enviar para a televisão, o que fez muito bem. Mas as publicamos aqui porque elas são a prova concreta de que está faltando alguma coisa para que eventos com este atraiam multidões, como acontece em todo lugar onde de promove algo semelhante. Pelo que se comenta à boca pequena, faltam investimentos, mais comprometimento, mais apoios e, naturalmente, todos podem ajudar, mantendo-se todo o seu significado para que ele se torne grandioso sem descaracterizar o seu objetivo.

Se a Igreja Católica, que o promove, não dispõe de recursos para que ele seja bem maior, que se busque esse apoio junto a empresários e ao poder público que possui uma Secretaria Municipal de Turismo justamente, acredito, para pensar em ações que atraiam mais e mais visitantes para a cidade.

O turismo é responsável pela economia de países como a França, Espanha, Itália e outros grandes países do mundo e também é difundido aos quatro ventos com grande estratégia de marketing por municípios alagoanos e sergipanos, vizinhos deste município e nas mesmas águas do Velho Chico...

Porque isso não acontece em Paulo Afonso? Há anos, enquanto modesto e sem recursos diretor do Departamento Municipal de Turismo de Paulo Afonso, empolgado com o aprendizado dos tempos de Abel Barbosa e dos cursos, pensava em muitos projetos nessa área – e muitos ficaram anotados por aí - quando recebi de um secretário, e pior, apoiado por outro secretário, um recado direto: “turismo não dá voto!” Assim também sempre foi o raciocínio de gestores municipais a respeito da cultura que, para alguns políticos de carteirinha, também não deve dar votos...

Não quero crer que argumentos assim norteiem ainda a gestão municipal...

A pequenez da procissão fluvial de São Francisco, organizada pela Paróquia de São Francisco, da Diocese de Paulo Afonso, nas muitas águas deste majestoso rio, em Paulo Afonso, trouxe à minha memória, a avaliação séria do meu arguidor do Mestrado em Ciências da Educação, na especialidade Turismo, em Lisboa, depois de ver as muitas belas imagens deste município, inclusive suas muitas águas e a minha defesa do potencial turístico de Paulo Afonso e região, este arguidor, Dr. Nelson Xavier, Professor Doutor do Curso de Doutorado em Turismo em Lisboa, aprovou a minha tese, fez elogios e disse, pensativo: “Eu só não entendo, Professor, como vocês têm tanto e não têm nada...”

Também continuo sem entender...

O vídeo a seguir, talvez leve algumas pessoas a refletirem sobre esse assunto...

Antônio Galdino da Silva

Especialista/Mestre em Turismo

Cidadão de Paulo Afonso