Os cuidados da vida costumam nos privar de certos valores. Este ano, por causa da Covid-19, ficamos privados do nosso São João. Nós nos referimos à festa popular que se confunde, em todos os seus meandros, com o Nordeste; com todos nós.
Pra trás, os nossos folguedos. Escanteadas, as nossas fogueiras. Banidas, recolhidas à memória, as quadrilhas (Paulo Afonso já foi campeão de quadrilhas). E as paqueras ingênuas do sertanejo forte, elas ficaram para o próximo ano. O São João, como o Lázaro da bíblia, ele não está morto. Apenas dorme o sono necessário para a contenção da pandemia de um vírus mortal.
Estamos apenas recolhidos. O São João deste ano está apenas recolhido. Ficará fermentando por doze meses para arrebentar muito mais potente no ano que vem.
Evidente que temos saudade da mais significativa das nossa festas. E logo neste ano que as chuvas benditas abençoaram a colheita do milho. Os sulistas, com aquele olhar de viés, certamente sabem o quanto de bem a nossa festa nos traz. As famílias se reúnem. Os clãs se animam. As vilas se congregam e os povoados celebram mais uma benção anual dada por Deus.
E cada casa tinha a sua fogueira. Cada esquina o seu ponto de venda de fogos de artifício. O ar, impregnado de fumaça, não ameaçava os nossos pulmões que aguentavam firmes a poluição. No São João, a fumaça apenas espantava os vírus mortais e, para alguns, os agouros da vida.
Ficamos sem o nosso São João. Quedamos abatidos momentaneamente por uma unidade minúscula que alguém esclareceu nem um ser constituir. Apenas uma coisa pequenina que veio talvez para abater um pouco o nosso excesso de confiança ou, quem sabe, providencialmente nos fazer voltar a saber quem realmente somos e o que fazemos no universo.
O vírus será vencido. Ficará na história como mais um desmancha-prazeres. Voltaremos às nossas origens e novamente dançaremos ao redor da fogueira empanturrados de pamonhas e de canjica, animados pelo licor responsável de quem sabe se divertir.
Francisco Nery Júnior
Fraternal abraço mestres Francisco Nery e Antônio Galdino.
Mais uma obra literária do mestre Francisco Nery. Parabéns professor, não tivemos este ano, mas teremos, se Deus permitir em 2021 a festa mais popular tipicamente nordestina.
Além da quebra de uma tradição secular em vista dos significados da data, associada à fartura da agricultura, a não realização dos festejos do mês de Junho - Santo Antônio, São João e São Pedro - está trazendo problemas sérios para a economia da região nordestina e os cálculos mais recentes dão conta que o prejuízo com a retirada desses festejos ultrapassa 1 bilhão de reais.