Envelhecer sorrindo é recomendação do poeta que acrescenta envelhecer como as árvores fortes envelhecem. Pois fortes envelhecemos e, no afã de envelhecer, vamos ficando menos ruins. Como a perfeição não é atributo conferido aos homens, não ficamos melhores, que significa mais bons. Ficamos menos ruins.
E assim amiúde nos surpreendemos nós mesmos com as nossas ações. Também procuramos nos exercitar na prática de enxergarmos o crescimento dos outros. Enxergamos e, fundamental, nos esforçamos para imitar.
A gaiola na mão, dentro o pobre pássaro privado do melhor bem que lhe foi conferido, a liberdade, o garoto cruzava os meandros da feira livre. Eu o parei e mostrei interesse no seu patrimônio. Até elogiei o seu esforço em gerar alguma renda para si e para sua família. Elogiei o esforço, propositadamente me impondo a cegueira de não ver o sofrimento do detento.
Elogio feito, confiança e relacionamento estabelecidos, lancei a proposta: quantos reais pela “mercadoria”? A resposta não exigiu pechincha. Passei-lhe os reais propostos e me tornei o dono não sei se legítimo da vida preciosa de um ser que a sorte havia lançado no pequeno espaço de uma gaiola repugnante.
O jovem campesino parecia feliz com a aquisição dos poucos reais. Creio que também me considerava feliz. Agora eu era o senhor supremo da bela – se bem que infeliz – criatura. Agora eu seria servido pelo seu mavioso canto. As notas soltas ao ar encheriam de felicidade a minha alma.
Lá dentro, resignado à sua sorte – azar na realidade -, o olhar significativo do pássaro mudou toda a história. Ele não precisou cantar. Muito menos protestar. Apenas olhou. Que poderia ele me dizer? Que a sua prisão era um profundo e cruel ato de covardia, eu já sabia. Não precisava ele me dizer. O seu olhar foi o comando para a minha mão lhe abrir a saída para a liberdade. Ele não rejeitou a proposta e saiu.
Meio desconfiado, pousou no primeiro galho que encontrou. Olhou para trás, num ato de agradecimento, e voou para a liberdade.
Francisco Nery Júnior