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Professor Nery

31 de março - Movimento militar de 1964

Publicada em 01/04/22 às 00:48h - 546 visualizações

Francisco Nery Júnior


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31 de março - Movimento militar de 1964
 (Foto: Net -)

“Chico Nery, o pau quebrou”. Foi assim que eu acordei com o meu pai me comunicando que o Movimento Militar de 1964 tinha começado. Eu tinha 16 anos e o meu pai fazia questão de me encaminhar nos meandros da cultura e do conhecimento. Ele, que tinha vivenciado os movimentos rebeldes e quarteladas, tenentismo e instabilidades da Velha República – ele era um velho tenente contramestre da Banda de Música da Polícia Militar da Bahia -, não deixou de me recomendar prudência e boca fechada. Foi assim que fui acordado no amanhecer do dia 1º de abril de 1964. 


O general Mourão Filho tinha se rebelado e partiu com os seus comandados de Juiz de Fora em direção ao Rio de Janeiro. Assim teve começo o que os militares fazem questão de denominar revolução e os seus opositores golpe – que perdurou até o início de 1985 com a redemocratização. 


As peculiaridades dos movimentos que interrompem a legalidade e procuram assegurar o domínio da situação estão bem estampadas nos vários meios de comunicação de que dispomos e os nossos leitores ligados já devem ter tido acesso a eles, sejam de tendência de direita ou de esquerda. Neste artigo de coluna, a nossa intenção é chamar a atenção dos nossos leitores para o que imaginamos ter escapado aos articulistas. 


Assim sendo, chamaríamos a atenção para o fato de o mundo, na época, estar vivendo a chamada guerra fria, tendo de um lado os Estados Unidos e, do outro, a União Soviética. O mundo quase mergulhou em uma guerra nuclear com a crise dos mísseis balísticos em Cuba. 

O Governo João Goulart se inclinava claramente para a esquerda e os Estados Unidos, escaldados da crise cubana, trabalhavam nos bastidores para a derrubada de Jango. 


A instabilidade do governo era flagrante. Se era uma técnica do próprio governo para a criação de um ambiente propício para algum tipo de endurecimento, o fato é que o controle da ordem pública lhe escapava das mãos. Era uma, duas ou mais greves ou paralizações quase todos os dias. Os militares se ressentiam do que denominam quebra da hierarquia militar. O Almirante Aragão ia para o meio dos marinheiros amotinados parlamentar em pé de igualdade com o Cabo Anselmo. O controle de preço dos itens de abastecimento da população escapava das mãos do governo. 


A classe média, assustada com as chamadas “Reformas de Base” do Governo, mal explicadas ou equacionadas, se assustava com a possibilidade do confisco puro e simples dos seus bens arduamente conquistados. Essa insatisfação, somada à insatisfação dos militares conservadores, mais a pressão americana contra o estabelecimento de um regime de esquerda na América do Sul; tudo isso compôs o caldo que resultou na possibilidade da tomada do poder pelos militares. 


Vale notar que os militares não intervêm. Eles são solicitados a intervir. Esta redação é de Afonso Arinos de Melo Franco. Nenhum individuo ou instituição dá golpe sozinho. Agora mesmo verificamos que o presidente Vladimir Putin se apoia numa oligarquia poderosa para invadir e atacar a Ucrânia. 


Na realidade, tudo indica que os militares não estavam preparados para nenhum tipo de golpe. O general Castelo Branco tinha sido homem de confiança de João Goulart. Em São Paulo, a dúvida era a adesão do General Amaury Kruel, comandante do II Exército, compadre do presidente salvo erro ou engano. Em Recife, o general Justino Alves Bastos teria aderido após verificar que o IV Exército não teria condições de enfrentar as forças já rebeldes do sudeste do país. 


A exceção seria o Terceiro Exército, com sede no Rio Grande do Sul, que queria resistir e lutar, o que não aconteceu porque o Presidente João Goulart decidiu não derramar o sangue dos brasileiros do sul do país e preferiu buscar o asilo político no Uruguai. 


Existem ainda os autores que afirmam que a esquerda estava mal organizada e não conseguiu dar o golpe antes das forças reacionárias. Dada à instabilidade reinante, ganharia quem saísse na frente. Prevaleceu a direita. 


Há que ser lembrado que houve exageros e mortes reclamados dos dois lados. Aconteceram sequestros e torturas relatados por vencidos e vencedores. 


E os militares se instalaram de corpo e alma no poder. Gostaram do ritmo e entraram na dança com gosto. Os chamados líderes civis foram paulatinamente sendo escanteados. 

Carlos Lacerda, o maior deles – que advertiu publicamente o ex-presidente Juscelino que “eu agora tenho a máquina que o senhor tinha nas mãos” –, terminou cassado e privado dos seus direitos políticos. 


Durante os quase vinte e um anos de domínio, os governos militares acumularam uma dívida externa considerável que pesou sobre os ombros dos brasileiros. Deixaram, porém, obras de infraestrutura que hoje contribuem para o desenvolvimento do Brasil. A Transamazônica, a ponte Rio-Niterói e o Reservatório de Sobradinho são alguns exemplos. 


O Lago de Sobradinho (aproximadamente duas Baías de Todos os Santos ou três Baías da Guanabara) alcança, amanhã, 1º de abril de 2022, segundo informação da Chesf, 100% da sua capacidade. O reservatório, de controle plurianual, torna possível o funcionamento simultâneo de todas as usinas da Chesf (ao contrário do que acontece na Usina de Belo Monte, no norte do país, que incompreensivelmente funciona no sistema de fio d’água). Em época de baixa vazão do rio, Belo Monte funciona com apenas uma turbina. 


O restante da dívida externa é hoje puramente figurativo. O nosso pesadelo é a dívida interna que não passava de oitenta bilhões de reais há cerca de vinte anos e já chega perto dos seis trilhões de reais, beirando a capacidade máxima de endividamento que leva em consideração a relação dívida-PIB (Produto Interno Bruto). 


Os militares, brasileiros como nós outros, já ficou estabelecido, intervêm quando são solicitados pelo lado vencedor. Não são nem mais nem menos patriotas que os civis (em pesquisa de confiança entre os brasileiros, estão logo abaixo da Igreja Católica que ocupa o primeiro lugar). Têm méritos e princípios importantes para compartilhar com a Sociedade Brasileira. 


Repetindo o que já foi escrito, cremos ter conseguido compor um relato sucinto, talvez por isso superficial, do que aconteceu no Brasil em 21 anos a começar em 31 de março de 1964. 


Francisco Nery Júnior



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