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Professor Nery

Em pleno mar com Roberto Campos

Princípios de desenvolvimento

Publicada em 11/01/25 às 15:31h - 255 visualizações

Francisco Nery Júnior


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Em pleno mar com Roberto Campos
 (Foto: Divulgação - Francisco Nery Júnior)

Em pleno mar com Roberto Campos

Princípios de desenvolvimento

Francisco Nery Jr.

Menino pobre do interior do Mato Grosso, aproveitou-se do seminário católico e decolou. Foi próximo e conselheiro de presidentes, primeiros-ministros, reis e rainhas. Foi um dos arquitetos da reorganização das relações econômicas entre patrões e empregados; relações não assistencialistas nem sazonais onde primaram os salários indiretos, substanciosos e duradouros. Dentre eles o FGTS, pecúlio garantido para o trabalhador, a correção monetária dos salários, a unificação dos institutos de previdência e a participação dos lucros das empresas, avanços entre a queda do Governo João Goulart e a ascensão dos governos militares. Como um, me beneficiei, como empregado da Chesf, desses avanços.

Como é fácil de verificar, a esquerda prega e a direita realiza. As bolsas de todos os tipos vêm de longe, dos assírios, egípcios e babilônios passando pelos gregos e romanos (os imperadores distribuíam farinha de trigo para o pão dos pobres do império). Santo Agostinho preconizava o auxílio aos pobres e os renascentistas mais para cá assim fizeram.

Então, leitor, estamos em pleno mar com um dos mais brilhantes economistas brasileiros, daqueles que souberam plantar com a paciência - e a incompreensão de muitos – em saber que o processo de maturação do fruto é lento.

Em pleno mar da costa brasileira, entre as brumas das ondas e o sobrevoo das gaivotas, poucas vezes na companhia de golfinhos, de Salvador até Santos e no mesmo retorno, reli seletivamente o primeiro volume de A Lanterna na Popa por Roberto Campos, escrito a partir de 1994 que creio se revelar atual.

Um cruzeiro pode se revelar tedioso e carecia se preparar. Embaixo de um céu de brigadeiro e num mar de almirante, compilei verdadeiras pérolas que podem nos ajudar no desenvolvimento do Brasil, incompreensivelmente lento até o momento. As citações são de luminares da época e do próprio autor. Por brevidade em um artigo de site, evitamos grafar a autoria, que pode, entretanto, ser confirmada na quarta edição, volume primeiro, das memórias.

A precisão dos posicionamentos do autor e o fato de ele ter sido contrabaixista da orquestra do seminário católico, foram determinantes para a minha cuidadosa leitura – e posterior revisão dos pontos marcantes – dos dois volumes das memórias. (O meu pai foi contrabaixista da Orquestra Sinfônica da Universidade Federal da Bahia por muitos anos.)

Roberto Campos é enfático ao afirmar que só existe democracia (e cita vários exemplos) com desenvolvimento; basicamente com habitação decente, saúde e educação.

Intercalando princípios basilares, o autor ameniza o seu estilo tecnocrata, talvez sisudo, com anedotas e citações de grandes homens com quem conviveu. O presidente Harry Truman, por exemplo, disparou que quem quisesse ter um amigo em Washington deveria comprar um cachorro. Em outra ocasião, Albert Einstein equacionou a teoria da relatividade para uma senhora de cabeça não muito brilhante durante um jantar. É fácil entender a relatividade, disse. Dois fios de cabelo na cabeça é muito pouco. Dois fios de cabelo em um prato de sopa é um horror.

Ao contrário da tendência brasileira para a burocracia excessiva, Roberto Campos afirma que o motor da economia é o empresário, e não o funcionário. Carece, todavia, agir com compaixão e pensar sem paixão.

Dos tempos de seminário, um padre competente que ficou adstrito a uma paróquia de interior para surpresa do colega embaixador. O protesto deste junto ao bispo, também ex-colega de turma, provocou a resposta: “O padre Carlos tem três impedimentos para subir na carreira eclesiástica. Primeiro, pendeu muito para a esquerda, o que é contornável. Segundo, viveu maritalmente com uma aluna do colégio das freiras, também contornável. Mas existe um impedimento incontornável. Desde os tempos de seminário, ele não crê mais em Deus”.

Em se tratando de tempos passados, disse o autor que quem não é socialista aos vinte anos não tem coração. Se permanecer socialista até os quarenta, não tem imaginação. As posições do autor, como aliás de qualquer ser mortal, podem apresentar paradoxos e contradições. Provavelmente ciente deste fato, a afirmação que Keynes, John Maynard Keynes, economista predominante no início do século vinte, era demasiadamente inteligente para ser coerente.

Os jantares e banquetes entre as elites política e econômica eram frequentes. Em determinada ocasião, um participante notou que a braguilha de Winston Churchill estava aberta e lhe passou um bilhete para receber a resposta: “Não se preocupe, pássaros mortos não voam”.

Banquetes, recepções e encontros não serviam necessariamente ao escape, à descontração e à diversão. O nivelamento e a troca de impressões são fundamentais. Uma das citações de Roberto Campos, bastante apreciada pelo presidente Jânio Quadros, rezava que entender bem os problemas é o começo para a solução.

Uma anedota encontrada nas memórias serve para o aprimoramento dos amantes da arte de escrever. Precisão, desnecessidade de verborreia, etc. Em determinado estabelecimento, a placa “Aqui se vende pescado fresco”. O “aqui” é desnecessário. Claro que não é acolá. “Vende-se” também dispensável. Ninguém sai distribuindo pescado de graça. Não é necessário o “fresco”. Ninguém vai expor e vender pescado deteriorado. Finalmente, argumentou um marinheiro que passava: “Não seria necessário o termo ‘pescado’. Todos na região sabiam que o meretrício ficava mais para baixo. O cheiro exalado no local só poderia ser de pescado”.

No tocante aos mitos, eles abundam no socialismo (Nasser, Che Guevara, Lula). O capitalismo e a democracia produzem resultados práticos. Coincidentemente, grandes líderes foram homens comuns, George Washington foi um “Pai da Pátria” num sentido mais que meramente simbólico e o versátil Jefferson procriou com uma escrava.

A tão propalada – e esperada – solidariedade internacional do comunismo foi desmentida com a ruptura entre Moscou e Pequim, uma clara manifestação que, ao contrário do que esperava Lênin, a solidariedade internacional do comunismo não se sobreporia aos interesses do nacionalismo.

O intérprete deve estar preparado para as “inconveniências” e os aperreios. Lembro-me que, num jantar do Rotary Club com membros noruegueses, o que eu menos tinha o direito de fazer era comer. A minha ocupação de intérprete para todos não me dava tempo para comer. Uma das agruras de Campos, como intérprete, dentro de um helicóptero quando da visita de João Goulart aos Estados Unidos foi uma “gritaria infernal”. As agruras se estendem ao fato de os diplomatas (o intérprete é, potencialmente, um diplomata) usarem as palavras para ocultar o pensamento.

Basilar, fundamental e preocupante a constatação do economista, assessor, embaixador e senador Roberto Campos segundo a qual a inflação derruba governos. A citação é de John Kennedy: “Nenhum país – disse ele – ferindo um tema que em conversas subsequentes amiúde reprisaria – pode resistir a uma inflação prolongada e violenta, sem convulsão social, terminando quase sempre no sacrifício das liberdades democráticas.”  - Donde a dúvida do autor desta compilação se o presidente Lula terminará bem o seu mandato.

Já sabemos que o socialismo é pródigo em criar mitos. Sobre Dom Hélder Câmara – um mito -, Nelson Rodrigues afirmou “só olhar para o céu para saber se devia usar guarda-chuva”.

O início da Revolução de 1964, o Governo Castelo Branco, foi marcado por decisões fundamentais na relação dos trabalhadores com o patronato. A ênfase era nos “salários indiretos” substituídos, hoje, pelas famigeradas bolsas (algumas necessárias e fundamentais). Criou-se o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, pecúlio garantido para o trabalhador, a correção monetária para os salários, a unificação dos institutos de previdência e a participação nos lucros das empresas. Tendo iniciado a minha vida profissional em 1967, me beneficiei proficuamente desses avanços.

Che Guevara, mito revolucionário do meio do século passado, acabou executado, profundamente decepcionado, em uma Bolívia quase que exclusivamente de miseráveis. Narra Roberto Campos: “O revolucionário romântico escolhera um mal lugar para implantar a revolução castrista. Como observou Goodwin, a pobreza por si só não é combustível para uma revolução ideológica, e sim a coexistência entre pobreza e privilégio. Na Bolívia, todos tinham ficado pobres depois da revolução de 1952, que distribuiu a terra aos camponeses e acabou com a oligarquia do estanho. Não havia muito que tirar dos ricos.”

Marcondes Ferraz está citado nas memórias. “Felizmente, havia sido designado para presidente da Eletrobrás o engenheiro Octávio Marcondes Ferraz, uma figura de escol, conhecido nos meios técnicos pela sua proeza em encontrar soluções originais para o fechamento da barragem da hidrelétrica de Paulo Afonso. Moralmente era un chevalier sans peur et sans reproche” (um cavalheiro destemido e irreprochável).

Já para o final, o Judiciário: “Dentro do dispositivo revolucionário, havia uma curiosa variante. Lembro-me de ter ouvido o velho brigadeiro Eduardo Gomes, figura que eu contemplava reverencialmente, dizer a Castello Branco que um dos graves erros da Revolução fora não ter expurgado o Poder Judiciário. Este, segundo ele, era até mais corrupto que o Poder Executivo e o Legislativo aos quais se havia aplicado o estatuto da cassação.

Em 1945, na disputa pela presidência, alguém previu a vitória de Eurico Gaspar Dutra sobre Eduardo Gomes. A lógica? “Dutra sabe que é burro enquanto Eduardo pensa que é inteligente”. Veio Castello Branco a passear em João Pessoa com o governador. Uma moça paraibana, surpresa, não se controlou: “Mas ele é feio!”. Castelo não se inibiu: “Viu, governador, isso é com o senhor!”. (Tive a chance de ver Castello Branco em uma solenidade em frente ao Quartel General do Exército em Salvador por acaso ao sair do Colégio Central da Bahia. A minha impressão foi a mesma da anedota relatada.)

Castello, vai outra anedota, teria dado um fusca de presente ao General De Gaulle cujas pernas não cabiam no interior do veículo. O general não se fez de rogado: deu um cachecol de presente a Castello – que não tinha pescoço. A falta de pescoço de Castello ensejou um elogio de um seu admirador: “Castello Branco é um homem honrado. Nasceu sem pescoço para ninguém montar nele”.  

E o encerramento com a reação espirituosa de um tio-avô de Roberto Campos, feio como cachorro, motivo de piadas no interior do Mato Grosso. Perguntado, por um gaiato inconveniente se feiura doía, tranquilamente respondeu: “Não sei. Eu nunca lhe vi chorando”.

Francisco Nery Júnior




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2 comentários


Adriana

11/01/2025 - 20:03:15

Angela, a mesma carinha. Saudade


Aníbal Alves Nunes

11/01/2025 - 16:20:38

Como sempre Francisco Nery nos presenteando com suas pérolas maravilhosas. Parabéns nobre confrade. Continue sempre assim. Abraços.


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