Numa pequena cidade, onde as palavras fluem pelas vielas estreitas como um riacho serpenteante, há uma máxima que ecoa entre as conversas de esquina: "O homem é dono do que cala e escravo do que fala. Quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo."
Pedro, um personagem peculiar nesse enredo cotidiano, é conhecido por sua língua afiada e suas histórias detalhadas sobre os outros habitantes da cidade. Ele se torna um narrador habilidoso, tecendo tramas e construindo narrativas sobre os vizinhos, amigos e até mesmo desconhecidos.
Certo dia, ao abordar o tema de Paulo, Pedro revela detalhes intricados sobre a vida do seu conterrâneo. Conta sobre as escolhas que Paulo fez, suas alegrias e desafios. No entanto, entre as linhas dessas histórias, revela-se muito mais sobre Pedro do que sobre o próprio Paulo.
É como se as palavras de Pedro fossem um espelho que reflete suas próprias experiências, suas percepções coloridas pela lente única da sua vivência. Enquanto ele descreve as escolhas de Paulo, seus comentários revelam nuances da própria visão de mundo, seus preconceitos, suas alegrias e decepções.
Assim, no palco das fofocas e confidências, Pedro se torna um autor involuntário de sua própria história, pintando a narrativa de Paulo com pinceladas de sua própria essência. A cidade, então, se torna um grande livro aberto, onde cada palavra dita pelos habitantes desvenda não apenas os segredos alheios, mas as complexidades ocultas de quem as profere.
Nessa trama sutil, percebemos que a comunicação é uma dança delicada entre a revelação e a ocultação, entre o que é dito e o que é silenciado. Pedro, o narrador involuntário, nos lembra da fragilidade das palavras, da sua capacidade de criar e distorcer realidades.
Ao pôr do sol, quando as luzes da cidade começam a cintilar, fica a reflexão sobre o poder da fala e a importância de discernir o que é dito. Pois, no fim das contas, quando Pedro fala sobre Paulo, é a própria essência de Pedro que se desnuda, transformando-se numa obra aberta aos olhos atentos da comunidade.
Luciano Júnior
Do livro: Minhas Crônicas no Exílio