Poderíamos iniciar com o faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço ou a falta de exemplo e a farinha abundante dos nossos líderes. Nos debates da Câmara Federal e do Senado, o costumeiro puxar a brasa para a sardinha de cada um. No executivo, o medo de liderar.
Não era o que o povo brasileiro, renitente otimista, esperava, nesta nova fase da vida nacional, de uma tendência e de um governo nacionalista e de direita. Esperávamos, todos nós, responsabilidade, pé no chão, lisura e austeridade. Não é o que estamos vendo.
Os detentores dos poderes executivo e legislativo parecem não entender que o Brasil está em fase de pré-falência. Esforçam-se para gastar mais; sempre mais. Exigem sempre mais para o seu grupo incompreensivelmente querendo esquecer que cerca de 83% dos brasileiros ganham até dois salários mínimos. Se esquecem que a maioria vive em verdadeiras favelas e que quase não temos mobilidade urbana. A assistência médica no Brasil é precária e a educação não melhora.
Por outro lado, o salário médio do pessoal do legislativo federal é de R$23.000,00. Isto mesmo: vinte e três mil reais. Não vamos citar o salário médio do Poder Judiciário. As aposentadorias dos nossos representantes são bastante pródigas enquanto a maioria dos aposentados do INSS ganham apenas um salário mínimo. Eles dispõem, além do salário polpudo, de auxílio moradia, auxílio paletó, auxílio correio, et cetera. (Cada senador recebe R$9.000,00 de auxílio correio em plena era da informática – informação do senador Cajuru.)
Decididamente não era o que esperávamos. Não foi para isso que elegemos presidente um capitão fora do stablisment. Pelo menos inferimos que não era um insider. Não foi para isso que renovamos a Câmara em cerca de cinquenta por cento. Vamos deixar de lado o sangue, suor e lágrima prometido por Churchill quando a Inglaterra ameaçava sucumbir. Vamos, todavia, lembrar Getúlio Vargas que ia a pé da sua casa para o palácio do Catete em plena ditadura da década de trinta. Embora ditador, saiu mais pobre do governo em 1945 do que quando entrou em 1930. Vamos sobretudo nos fixar em Lee Iacocca.
Lee Iacocca tinha sido presidente da Ford Motor Company, demitido pelo dono, neto do fundador Henry Ford, após uma série de enciumadas e picuinhas. Foi um daqueles casos em que o brilho e a virtude não são tolerados pelos pequenos. A montadora Chrysler, concorrente da Ford, estava em estado pré-falimentar. As dívidas se acumulavam e o fechamento era certo. Sem ser Severino, Iacocca foi convocado. A tarefa primordial do novo presidente foi tentar convencer o pessoal da Chrysler que o momento era de aperto. A salvação só viria com medidas duras. E ele conseguiu. Uma das afirmações de Lee Iacocca nas suas memórias é que ele, o maior salário de um executivo de então, nunca conseguiu deixar de se sentir incomodado quando via em sua casa um pedaço de carne ser jogado na lata do lixo após o almoço. Ali estava sendo descartada parte do esforço de toda uma cadeia de produção.
O que arregimentou o pessoal da Chrysler em torno do novo executivo para o esforço de recuperação da empresa não foi necessariamente o desejo de não perder o emprego. Isto foi importante, mas não foi a causa. A confiança no novo chefe, a certeza que valeria a pena um grande esforço, o doar sangue e ser comprometido se estabeleceram quando o novo presidente declarou que o seu salário durante todo o primeiro ano de recuperação seria apenas de US$1.00 (um dólar). Assim a montadora foi salva.
Temos todos que gritar e pressionar os nossos representantes. Já que Deus [ainda] não manda fogo dos céus para consumir os maus, irresponsáveis, egoístas insensíveis e hipócritas, que fazer? Quando a tempestade finalmente desabar, eles já estarão longe vivendo das suas contas polpudas alimentadas pelo sangue dos brasileiros.