Nada a ver entre Ribeiro e a malandragem. Muito pelo contrário, Ribeiro, colega ainda da Chesf, com pontes de safena e uma vida de luta e resistência, é a encarnação pura e simples do trabalho, da virtude e da vetustez. Em suma, Ribeiro é todos nós; somos nós outros.
Dá gosto entrar na barbearia de Ribeiro. Parece que a honra e a seriedade se juntam lá na frequência, nesse caso masculina, da nata de Paulo Afonso. Eles constituem o banco de reserva da cidade que a maioria dos gerentes prefere ignorar. Têm tanto a contribuir, mas são forçados a se resignar na cadeira do barbeiro. Chega um e chega outro, entram e saem de cabelo cortado, barba criteriosamente feita, despejam experiência, diagnosticam (não encontrei um sinônimo mais palatável para o leitor) ruídos e vão embora deixando para trás um misto de estupefação (também não) e resignação.
Ainda sobre Ribeiro, filhos e mulher retos nos princípios da fé, Ribeiro direto ao assunto. Ribeiro que correu atrás do ladrão de moto-táxi, o abordou e imobilizou com um mata leão, ignorando a possibilidade de uma vingança, Ribeiro que tirou o relógio da parede e ofertou para a mulher que insistentemente passava pela sua barbearia a perguntar as horas.
Essa plêiade (de novo) de valores poderia atuar. Poderiam ofertar soluções. São os anciãos que não deixavam o mundo antigo vacilar. O mundo seria melhor. Não prestam mais. O prazo de validade venceu. A parceria com os jovens dos start-ups (também valorosos) não acontece. Não se trata, nesta crônica, de laborar em causa própria. Muitos de nós optamos pelo merecido descanso. Os malandros agradecem. O caminho está livre. Malandramente, agradecem. E todos padecem!
E como impressionam as técnicas desenvolvidas pelos malandros! Uma delas é desclassificar.
[Tentar] ridicularizar aquele em quem identificam o perigo. E nisso são mestres. Não importa que mais adiante cometam erros infantis. Partem para alto-mar e geralmente lá perecem ou desaparecem na poeira do tempo ou no fundo do abismo. A poeira do tempo é o troféu que bem merecem.
Outra técnica é o modismo. Apelam para a terminologia da malandragem e impressionam os incautos. Cantam o canto da sereia. Decoram uma meia-dúzia de palavras, umas tiradas da baú da malandragem antiga, e esbanjam cultura: colocação, empoderamento, desconstrução. Como “colocação” deslocou para sempre a minha capacidade de raciocínio e interação no meu período das trevas. Usaram, abusaram e demonizaram o termo. Os rios de recursos investidos pouco serviram, a não ser para enriquecer alguns malandros que, curvados, hoje desfilam nos shoppings das nossas capitais, com as caras, sem ofensa, das rezadoras peninentes do alto sertão.
E nós, nós outros ficamos nós a lamentar o tempo perdido se perdido fosse o tempo dos que têm fome e sede de justiça.
Francisco Nery Júnior