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Opinião/Reflexão/Crônica

A cadeira de rodas que não comprei

Ou a Prova de Vida do INSS

Publicada em 03/07/19 às 23:51h - 1020 visualizações

Francisco Nery Júnior


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A cadeira de rodas que não comprei
 (Foto: Imagem RPC Curitiba)

Eu já tinha separado a quantia necessária para a aquisição de uma cadeira de rodas, daquelas bem equipadas que vemos na turma dos mais favorecidos. Na minha cabeça, não daquelas que vemos nas feiras livres ou nas calçadas acidentadas da cidade.  Ia fazer um sacrifício. Tinha que ser uma cadeira para os noventa anos; para a idade provecta para o leitor se acostumar com um termo menos banal.

Horas antes, tinha assistido que um segurado do INSS, com pneumonia grave, havia chegado a uma agência do instituto nos braços de um caridoso qualquer. O aposentado de 90 anos tentava, nos braços que o amparavam – não era o Estado que o amparava –, provar que estava vivo! Sem essa prova, nada de retirar o benefício mensal de pouco menos de mil reais. Carecia provar a vida para assegurar a subsistência.

Comecei a trabalhar aos vinte anos. Entrei na atual Coelba, Companhia Energia Elétrica da Bahia, e iniciei minha contribuição mensal ao sistema previdenciário. Doces tempos em que calculávamos o salário dos empregados da empresa em máquinas rudimentares e recebíamos o nosso em dinheiro vivo na nossa repartição. Os cruzeiros, reais da época, vinham em envelopes cor de palha, trazidos pelo tesoureiro auxiliar. Embolsávamos a grana e assinávamos o documento de recebimento.

No contracheque, o desconto compulsório para o setor previdenciário – que eu detestava. Se consultado, eu, já naquela altura da minha vida, teria optado por iniciar, com aquele desconto, meu próprio sistema de capitalização. Eu havia nascido, trabalhava, e haveria de me aposentar no Brasil. Desconfiava que algo não sairia bem. Sabia que seria enganado. 

Reduzindo a história para o bem e alegria do leitor, após 35 anos de contribuição, mais da metade deles contribuindo “no teto”, a minha aposentadoria de dez anos pouco passa dos mil reais. Já aposentado, voltei a trabalhar e a contribuir também no teto por mais seis anos. Foram seis anos de contribuição para Tibério; para nada acrescentar ao meu estipêndio mensal. Estaria certamente passando necessidade se não tivesse me preparado de outra forma; se tivesse confiado no sistema.

Enquanto isso, as categorias que têm as costas largas de corporações organizadas vão levando vantagem e desfigurando o caráter de sacrifício geral da Reforma da Previdência ora em debate no Congresso Nacional.

Mil reais já fazem uma feira e carece recebê-los. Sempre recebê-los. É um “direito adquirido”. Recebê-los até os noventa anos! Se bem de saúde, sem pneumonia ou o que o valha, em cima dos pés; nos bancos ou nas agências. Se não, nos braços de um piedoso samaritano ou numa moderna cadeira de rodas.

Francisco Nery Júnior

P.S. A informação posterior que tenho é que a prova de vida poderia ter sido feita, na impossibilidade de deslocamento do segurado, pelo telefone 135, o que me fez desistir da previsão de compra da cadeira. Também informar que o pobre coitado morreu no dia seguinte à prova de vida.




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