Em 2017, a notícia da redução da vazão do rio São Francisco para apenas 550 metros cúbicos (as usinas de Paulo Afonso precisam de mais de 2 mil metros cúbicos para produzir energia hidroelétrica) trouxe um grande susto e aumento a nossa apreensão e tristeza pela morte lenta deste rio.
Esse sentimento de perda resultou num texto que, dada a sua atualidade, resolvemos colocar outra vez no site. Quem sabe alguém consegue ouvir o nosso grito?... (Antônio Galdino)
Em 2017, uma notícia impactante: vazão do rio São Francisco em Paulo Afonso: 550m³/s...
Esta notícia veiculada rapidamente na televisão e nas rádios e espalhada mundo afora pelas redes sociais dói muito mesmo porque é verdadeira e muito séria, muito delicada e, infelizmente, na sanha dos muitos interesses pessoais de quem se diz representante desta região sertaneja no Congresso Nacional, esta verdade tão dolorida, apenas soa, seca e sem comentários e não ocupa os espaços dos plenários que decidem – as Câmaras Municipais, as Assembléias Legislativas e a Câmara e o Senado Federal.
Também não tem merecido espaço maior e de destaque na grande mídia nacional, nas revistas com tiragem acima de um milhão de exemplares toda semana, nem nos noticiários das grandes e pequenas também emissoras de televisão que reservam quase todo o tempo para falar de ladrões de todo tipo, especialmente políticos e empresários, todos acobertados por uma lei que é um cobertor curto e, longe de assegurar a todos a igualdade garantida pela constituição, está muito longe de ser igual para todos.
Li, com satisfação o texto de Luciano Júnior comentando a matéria sobre a redução da vazão do rio Francisco, mais uma, porque senti que não estou sozinho nessa luta desigual.
Ele começa citando um trecho de um comentário que fiz sobre esta mesma matéria quando digo: “Precisamos ficar atentos para anunciar quando vão fechar a torneira do rio de uma vez. E lembrar que já vi passarem por aqui mais de 15 000 metros cúbicos por segundo... E que D. Pedro II saiu do Rio de Janeiro para cá só pra ver a Cachoeira de Paulo Afonso, que mereceu versos de Castro Alves e de centenas de outros, poetas e cantadores...Ver chegar a esse ponto, dói...”
Diz, Luciano Júnior: "Meus caros amigos, infelizmente esta está sendo uma morte anunciada e resultante de um crime de mando. Anunciada quando dezenas ou mesmo centenas de pesquisadores renomados, alguns de reconhecimento internacional, alertaram. Mestre Galdino, nossa monografia da ADESG foi sobre este tema. E, nenhum líder político ribeirinho vestiu a camisa.
Recordo-me do Bispo (Dom Frei Luiz Flávio Cappio) na greve de fome, quando fui visita-lo numa capelinha lá pra bandas de Belém de São Francisco. O político que lá apareceu foi pra mentir. Prometendo revitalização, que nunca ocorreu. Se o triste mentiroso que lá foi, que depois governou descaradamente o Estado da Bahia fosse católico deveria ser excomungado com requintes de perversidade.
Crime de mando, porque dentre as sangrias que sugam os cofres desta nação muito foi desviado com pseudos projetos de revitalização. O tema "vamos salvar o a velho Chico" foi usado em muitas campanhas políticas...
Enfim, apreciem bem o que resta dele. Olhem bem para os belos lagos de Paulo Afonso e Itaparica, porque só neles ainda resta água...E, guardem bem as imagens, pois em curto tempo haverá uma lápide com "Aqui jaz o Rio da Integração...”.
Há anos que estão matando o rio São Francisco. Há anos temos chamado a atenção para isso, como lembrou bem o caro Luciano Júnior, também ele um defensor desse rio quando atuava na ASCOPA (Associação Comercial de Paulo Afonso) e na Maçonaria de Paulo Afonso e como um dos que assinaram a Monografia da nossa equipe da Pós-Graduação – Curso de Política e Estratégia da ADESG/BA no ano de 2006.
Naquela época, sob o escopo acadêmico da seriedade que é a ADESG, já mostrávamos as opiniões de consagradas estudiosos como o então decano da geografia no Brasil, Aziz Ab`Saber, que do alto da sabedoria dos seus 80 anos, como Professor Emérito da USP – dizia na época: “Essa história (da transposição do rio São Francisco) me deixa indignado porque eles, os governantes e os políticos, não têm noção de escala, e sabem que o povo também não tem. O semiárido tem 750 mil quilômetros quadrados. A transposição não irá resolver o problema. O problema essencial é que, para um país do tamanho do Brasil, não basta pegar um pequeno ponto e fazer dele uma demagogia sobre planejamento. Com os 2 bilhões* necessários para iniciar a transposição, seria possível resolver vários outros problemas do Nordeste”.
*2 bilhões foi o valor anunciado. Ao final (ou quase) o custo mais de mais de 10 bilhões.
Na época, outros estudiosos nordestinos como João Adner Guimarães Júnior, Professor Adjunto do Dep. de Engenharia Civil da UFRN, João Suassuna da Fundação Joaquim Nabuco, do Recife/PE, D. Luiz Flávio Cappio – Bispo da Barra, mostraram-se contrários a esse projeto.
No campo político, o presidente Lula sempre foi o grande defensor da transposição. Marina Silva, então Ministra do Meio Ambiente também defendeu o projeto. Os governadores, de acordo com as conveniências que lhe interessavam no momento, pra variar, ficaram divididos.
No âmbito da Justiça Federal, enquanto o Procurador Geral da República, Antônio Fernando de Souza (cearense) por um lado pedia a suspensão da obra de transposição, no Supremo Tribunal Federal, o ministro Sepúlveda Pertence suspendeu todas as liminares concedidas pela justiça contra a transposição das águas do rio São Francisco.
De novo, vem à mente, ecoando forte, as palavras de José Theodomiro Araújo, conhecido como Velho do Rio, falecido em 2003 um intransigente defensor do rio São Francisco, que disse em um dos seus pronunciamentos em defesa deste rio, como um imortal epitáfio:
“Está enfraquecido o Velho Chico, e agoniza, jurado de morte que foi pela ganância e inconsciência dos seus próprios filhos. E quando ele morrer, no lugar onde hoje é a cachoeira Casca d’Anta, nós, que o amamos, faremos fixar no paredão da serra o epitáfio: 'Por aqui passou um rio que foi destruído por um povo que usou a inteligência para praticar a burrice'.”
E agora, se já muito sofrem os que vivem rio acima, nas vastas regiões dos sertões que vão de Paulo Afonso a Sobradinho e subindo pelo serrado até as nascentes nos chapadões de Minas Gerais, igualmente sofrem os que moram na região do Baixo São Francisco, de Piranhas até a foz, trecho percorrido pelo Imperador D. Pedro II, chamada de Rota do Imperador, caminho das águas que fez, da foz até Piranhas para dali, seguir a cavalo para conhecer as beleza da outra majestade, a Cachoeira de Paulo Afonso, de que nos resta apenas, como disse o saudoso Carlinhos da Sala dos Visitantes, “apenas um retrato na parede”.
Quem, de fato, viu a Cachoeira de Paulo Afonso em todo o seu esplendor, não pode impedir que se entristeça o seu coração já machucado.
E, como não temos recursos nem apoios financeiros para publicar esse estudo sobre a transposição, feito pela equipe que se chamava “Águas Inquietas”, até que um dia o publique em livro, estou disponibilizando na internet para livre leitura e me disponho a enviar cópias em PDF para quem tiver interesse em conhecê-lo.
Depois, um dia, no querer de Deus, vou providenciar uma exposição com fotos da Cachoeira de Paulo Afonso e do Cânion do rio São Francisco em toda a sua plenitude, como registro de um tempo de muitas águas.
É o meu jeito de gritar!
Antônio Galdino no site www.folhasertaneja.com.br
(texto de setembro 2017 – parece que foi hoje...)
Transposição: tirar sangue de um anêmico. Obra caríssima quando há ene maneiras de amenizar os efeitos da seca. Não se combate seca. O caminho, no nosso entender, é a aplicação de políticas públicas e a busca da vocação (possível) da região. Como, por exemplo, fazer agricultura no Nordeste sem irrigação? Como criar gado de grande porte sem pastos naturais? Por que não educar os nossos campesinos para a cultura da silagem e da preparação para o tempo das vacas magras? No inverno rigoroso dos países frios, o gado é recolhido e alimentado "artificialmente". Por que não usar o Banco do Nordeste para financiamento de projetos factíveis para a região? A Embrapa com certeza daria conta do recado.Temos que opinar e prestar muita atenção para a exortação do colunista e dos conferencistas. Trata-se de não enterrar os talentos (vide parábola bíblica).63
Um texto verdadeiro e atualíssimo. O Rio São Francisco agonia dia a dia. Tantos alertas já foram dados, porém a inércia humana permanece. Entra governo, sai governo e o descaso é sempre o mesmo!