Em recente pesquisa fotográfica encontrei umas imagens do acervo da Chesf e que me chamaram a atenção por ter uma mulher piloto. Analisando as figuras fui lendo mensagens existentes na fuselagem da aeronave e fiquei sabendo que a piloto se chamava Ada Rogato e fiz uma breve pesquisa sobre ela, encontrando informações importantes que traduzem a seriedade daquela ilustre mulher que no momento estava pisando as ruas da Vila Poty em Paulo Afonso, Bahia.
Em uma das imagens podemos ver por trás do avião a Igreja São Francisco, funcionários da Chesf conduzindo até o avião uma estátua de Nossa Senhora Aparecida, alguns mecânicos inspecionando o avião.
Além das autoridades presentes, uma multidão se aglomerando para apreciar o pouso de Ada Rogato, crianças tocando a aeronave.
O avião tem assinaturas e mensagens escritas do mundo todo. Em uma das anotações mais interessantes vemos uma assinatura de Getúlio Vargas.
MAS QUEM FOI ADA ROGATO?
Ada Leda Rogato nasceu em São Paulo, no dia 22 de dezembro de 1910 e faleceu também em São Paulo, no dia 15 de novembro de 1986.
Ela foi uma pioneira da aviação no Brasil. Foi a primeira mulher a obter licença como pára-quedista, a primeira volovelista (piloto de planador) e a terceira a tirar o brevê como piloto de avião. Também se destacou por suas acrobacias aéreas e foi a primeira piloto agrícola do país.
Voando sempre em aeronaves de pequeno porte e sempre sozinha, sua fama nacional e internacional cresceu a partir dos anos 1950, graças à ousadia cada vez maior de suas proezas, que fizeram dela
A primeira piloto brasileira a atravessar os Andes, em 1950;
A única aviadora do mundo, até 1951, a cobrir uma extensão de 51.064 km em vôo solitário pelas três Américas, chegando até o Alasca;
A primeira a atingir o aeroporto de La Paz, na Bolívia, o mais alto do mundo até então (1952), com
um avião de apenas 90 HP – feito inédito na história da aviação boliviana;
O primeiro piloto, homem ou mulher, a cruzar a selva amazônica - o temido "inferno verde" - em um pequeno avião, sem rádio, em vôo solitário em1956.
A primeira aviadora a chegar sozinha à Terra do Fogo, no extremo sul do nosso continente em 1960.
Quando o pára-quedismo como atividade esportiva começava a ganhar seus primeiros adeptos no Brasil, a audaciosa Ada se tornou campeã da modalidade - brasileira em 1943 e paulista em 1948, ano em que também iniciou suas atividades como piloto agrícola; e aproveitou seu reide de 1950 por quatro países sul-americanos para demonstrações em pára-quedas, tornando-se assim a primeira mulher a saltar no Paraguai e no Chile.
Filha única do casal Maria Rosa e Guglielmo Rogato, Ada recebeu dos pais, imigrantes italianos, a mesma educação dada à maioria das moças da época, além do colégio, aulas de piano e pintura -, mas sua ambição ia além: queria aprender a voar. E não abandonou sua meta mesmo quando seus pais se separaram e ela teve de ajudar a mãe não só nas atividades domésticas como em bordados e trabalhos artesanais para se sustentar.
Conseguiu juntar dinheiro suficiente para as aulas que lhe possibilitaram tirar em 1935 o primeiro brevê feminino de vôo a vela e, no ano seguinte, a primeira licença concedida a uma mulher pelo Aeroclube de São Paulo para pilotar avião. Um curso de pára-quedismo feito no Campo de Marte em 1941 lhe garantiu o primeiro certificado de pára-quedista concedido a uma brasileira.
Adepta incondicional da aviação esportiva, Ada passou desde então a usar suas habilidades para divulgar a aviação: com suas acrobacias aéreas e seus saltos de pára-quedas, ajudava a atrair público para os eventos aviatórios organizados tanto nas capitais como nos recém-fundados aeroclubes do interior de São Paulo e de outros Estados. Durante a Segunda Guerra Mundial, realizou voluntariamente 213 vôos de patrulhamento aéreo do litoral paulista. E em 1948, quando as autoridades decidiram dar combate aéreo à broca do café - praga que ameaçava as plantações do nosso principal produto de exportação na época -, ela aceitou o desafio de cumprir a tarefa que a transformou em pioneira do polvilhamento aéreo no Brasil.
Discreta e persistente no preparo de seus vôos, Ada agia da mesma forma em sua vida privada. Mulher solteira e sem filhos, trabalhava para viver como funcionária pública estadual. Começou em 1940 como escriturária no Instituto Biológico, vinculado à Secretaria da Agricultura, e aposentou-se em 1980, como chefe de seção técnica da Secretaria de Esportes e Turismo. Nos anos 1950, foi redatora de aviação da Revista dos Aviadores e também da magazine Velocidade.
Seu jeito modesto, no entanto, não a impediu de merecer da imprensa nacional e internacional inúmeros títulos por suas proezas, tais como "Milionária do Ar", "Águia Paulista", "Rainha dos Céus do Brasil" e "Gaivota Solitária" (imprensa brasileira, anos 1950); e da revista chilena Margarita ganhou o apelido de "Condor dos Andes".
Entre centenas de troféus e condecorações, foi a primeira aviadora a receber no Brasil a Comenda Nacional do Mérito Aeronáutico, no grau de Cavaleiro, e ainda as Asas da Força Aérea Brasileira e o título de Piloto Honoris Causa da FAB; também no grau de Cavaleiro, recebeu na Bolívia a Condor dos Andes; no Chile, foi condecorada com a Bernardo O’Higgins no grau de Oficial e na Colômbia com as Asas da Força Aérea Colombiana, primeira entregue no país a uma aviadora. Em 1954, recebeu da Federação Aeronáutica Internacional, sediada na França, o diploma Paul Tissandier por seus méritos na aviação.
Em 1956, Ada foi convidada a fazer parte da comissão organizadora das comemorações do Cinquentenário do 1º vôo do 14-bis. Sua sugestão foi a realização de um reide por todos os Estados e Territórios brasileiros para homenagear e divulgar os feitos de Santos-Dumont. Nesta viagem, ela percorreu 25.057 km em 163 horas de vôo, levando consigo não só material sobre a vida e obra do Pai da Aviação como também, a pedido das autoridades eclesiásticas, uma imagem de Nossa Senhora Aparecida em peregrinação aérea. O roteiro não se restringiu às capitais: com seu espírito aventureiro, a aviadora o estendeu a locais perdidos do interior, sobrevoando com seu minúsculo Cessna trechos quase inexplorados do Centro-Oeste, descendo em campos de pouso recém-abertos na mata e visitando várias aldeias indígenas. Foi mais uma vez pioneira ao atravessar sozinha e num pequeno avião a selva amazônica, incluindo o até hoje temeroso trecho Xingu-Cachimbo-Jacareacanga.
Mesmo com todos esses louros, Ada ainda não estava satisfeita: após ter atingido o Círculo Ártico, o aeroporto mais alto e as profundezas da Amazônia, queria chegar também ao extremo sul do continente. E só encerrou sua série de grandes viagens quatro anos depois (1960), quando se tornou a primeira piloto a chegar a Ushuaia, na Terra do Fogo, na Argentina, a cidade mais austral do mundo – ainda a bordo do mesmo Cessna, chamado "Brasil".
E só não foi mais longe nos anos seguintes por não ter conseguido obter um avião maior e mais potente.
Como membro da comissão do Cinquentenário do 14-bis, a aviadora passou posteriormente a fazer parte da Fundação Santos-Dumont (FSD), destinada a cuidar do acervo do inventor e apoiar o desenvolvimento da aeronáutica. Como dirigente dessa entidade – da qual foi sucessivamente conselheira, secretária e presidente -, Ada recepcionava os visitantes mais ilustres do Museu da Aeronáutica da FSD (o primeiro da América do Sul), ao qual doou o seu "Brasil". Entre esses visitantes, contam-se vários astronautas norte-americanos - incluindo Neil Armstrong, que, antes de se tornar o primeiro homem a pisar na Lua, conheceu ali a aviadora e seu avião e a elogiou por suas façanhas. Ao morrer em 1986, Ada ainda era diretora do Museu que abrigava o seu inseparável "Brasil".
Em 1984 foi lançado o filme de curta metragem Folguedos no Firmamento da diretora Regina Rheda, enfocando os feitos de Ada Rogato; esse filme foi exibido durante cinco anos em cinemas de todo o Brasil. Poucos anos após a morte de Ada Rogato, o Museu da Aeronáutica foi fechado e seu acervo se dispersou ao ser removido do espaço que ocupava no Parque Ibirapuera, em São Paulo. Em 2000, os Correios homenageavam a ilustre aviadora ao lançar, sob o tema "Mulheres Aviadoras", um carimbo postal e um selo comemorativo dos 50 anos do primeiro sobrevôo dos Andes por Ada com seu "Brasileirinho", um avião CAP-4 de apenas 65 HP. Algumas referências públicas à brava piloto estão em uma praça na cidade de São Paulo e em uma rua de Ribeirão Preto, SP que levam seu nome. Atualmente seu Cessna 140-A "Brasil" encontra-se exposto ao público no Museu TAM, localizado em São Carlos - SP.
Foi assim então que essa heroína do Ar sobrevoou a Cachoeira de Paulo Afonso com seus Cânions e pisou as terras da Vila Poty.
A cidade acabou inserida nos roteiros de Ada Rogato, viagem acontecida em 1956, data essa assinalada nas fotos, quando ela foi convidada a fazer parte da comissão organizadora das comemorações do Cinquentenário do 1º vôo do 14-bis onde divulgava os feitos e méritos de Santos Dumont. Nesse trajeto ela percorreu 25.057 km em 163 horas de vôo.
São fatos eternizados e que contam nossas histórias, registros perpetuados através de algumas fotografias amareladas pelo tempo, mas que nos brinda pela importância do evento acontecido e ser palco de tão Divina Dama do Ar.
João de Sousa Lima
Escritor e Historiador
Presidente do IGH - Instituto Geográfico e Histórico de Paulo Afonso
Paulo Afonso-BA, 03 de março de 2021.
Como tivemos pessoas maravilhosas. no passado....O BRASIL TEM UM BELO PASSADO PELA FRENTE
Mestre João de Sousa LimaOnde se lê: Alda Ragatto; leia-se Ada Ragato.
Mestre João de Sousa LimaParabéns pelo excelente artigo sobre Alda Ragatto em Paulo Afonso.
Quanta riqueza de informações nessa reportagem sobre Ada Rogatto e uma bela homenagem da Folha Sertaneja pela escolha de uma nulher guerreira em sobrevoar nossa querida Paulo Afonso, cidade de pura energia. Saudade da infância e adolescência vividas às margens da Cachoeira! Parabéns pela reportagem..
Excelente artigo!!Parabéns João Lima.