De todas as filas a que o brasileiro se submete, talvez a maior e mais angustiante delas seja a de transplante de órgãos. Não há trânsito caótico nem saque bancário que faça aglomerar mais de 53 mil pessoas, como é o caso daquelas que aguardam por um doador. Os dados são do Ministério da Saúde. E essa fila é morosa. Até setembro do ano passado, haviam sido registrados apenas 1.452 doadores.
Para agravar o quadro, a pandemia de Covid-19 vem limitando ainda mais o acesso aos órgãos. Em 2021, houve uma queda de 13% do número de doadores efetivos em relação a 2020 e de 18% em relação a 2019, como consta no relatório da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). O motivo é que o vírus eleva a taxa de contraindicação para 44%, visto que sua transmissibilidade pode ocorrer durante o transplante. Outro problema: os transplantes ocorrem nas UTIs dos hospitais, exatamente as alas que mais sofreram lotação máxima durante boa parte da pandemia.
Essas são as informações ruins. Mas há bons motivos para que os pacientes à espera de transplante de fígado elevem suas esperanças. Essa fila, especificamente, tem potencial de reduzir consideravelmente graças a um procedimento chamado split liver, cuja tradução é “fígado dividido”. Trata-se de uma cirurgia prévia que divide o órgão ao meio e ainda assim preserva suas funções, permitindo atender a duas pessoas que aguardam pelo atendimento.
Ainda há restrições ao número de cirurgias de divisão do fígado, sobretudo pela inexistência de protocolos bem definidos sobre o procedimento. A padronização só ocorre com o tempo, e ainda põe o órgão em risco. Para uma fila imensa de pessoas aguardando por um transplante hepático, cada um que chega em condições adequadas à mesa de cirurgia é um troféu a ser comemorado. Daí a dificuldade de se intensificar um método que poderia reduzir a fila pela metade.
Ainda assim, é inegável que o split liver pode representar um novo cenário para quem aguarda por alguns órgãos transplantáveis. A ciência vem aprimorando suas técnicas, inovando os procedimentos e apontando novos caminhos para dar celeridade a quem depende de uma cirurgia de órgãos para sobreviver. No ritmo histórico de oferta e demanda no Brasil, é fato que muitas pessoas continuarão perdendo vidas antes de ir para o bloco cirúrgico. Mas esta pode ser uma resposta à altura para quem já está perdendo a esperança.
Priscila
Mendes - Depto.
de Jornalismo - E-mail: priscila@