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Sementes do Raso... Por Edson Mendes

SOBRE A IMPORTÂNCIA DO LUGAR

Publicada em 07/08/24 às 23:31h - 142 visualizações

Edson Mendes


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SOBRE A IMPORTÂNCIA DO LUGAR
 (Foto: imagem ilustrativa)

SOBRE A IMPORTÂNCIA DO LUGAR

Edson Mendes

José Santos, em seu pequenino e belo texto “Viagem, a diferença que importa”, nos diz que a vida é bela. Muitos já o disseram antes. Xavier de Maistre, um jovem militar em confinamento disciplinar de quarenta e dois dias nos próprios aposentos, na cidade de Turim, escreveu em 1794 um pequeno livro que chamou de ‘Viagem ao redor do meu quarto”, seguido em 1825 de uma continuação, “Expedição noturna ao redor de meu quarto”. Depois general, e também diretor da Biblioteca do Museu Real de São Petersburgo, é uma referência da arte literária moderna, pelo estilo, pelo insólito e pela fantasia. José Santos, nascido no Porto, engenheiro, teve uma carreira bem-sucedida como diretor executivo de um grupo empresarial em seu país, e depois diretor executivo de uma empresa multinacional italiana por dez anos. Desde 1995 dedica-se ao trabalho acadêmico, um sonho de sua juventude, no INSEAD, em Fontainebleau, a 67 km de Paris, onde é, hoje, Professor Afiliado de Prática em Gestão Global.  Foi Senior Lecturer no MIT, em Cambridge, Massashussets, EUA, onde viveu por cinco anos, e é, ainda, Professor Catedrático Convidado na UCP, Portugal. Em conferências ao redor do mundo, trabalhou com equipes de alta administração de corporações multinacionais da Europa, das Américas e do Japão.
Alguma similaridade há, sim, entre os dois. E deles com tantos outros por este manifesto que, cada um a seu modo e por seus meios, nos diz que “a vida é bela”. Há, todavia, uma particularidade que em José Santos o distingue de tantos, e de todos. Xavier de Maistre nos diz o que diz em dois volumes. José Santos, em duas páginas. E há, também, além do texto, o contexto: Joe Santos não tenciona nos revelar que a vida é bela. Nós, os leitores, assim concluímos por via de seu talento, em um texto que não revela – desvela. E nos conduz à poesia dos pequenos gestos e das pequenas coisas que são, e isto sabemos, por detrás dos anteparos a essência da vida.

A precisão, a concisão e o poder de síntese, bem como a gestão do tempo e dos materiais, lhe são peculiares, como também o são a seus colegas engenheiros Leonardo da Vinci, Joaquim Cardoso, Le Corbusier (a beleza está na reta). Niemeyer (a beleza está na curva), João Cabral de Melo Neto (um galo sozinho não tece uma manhã).

Sobre os modos, e os meios, e como os usa no manuseio das palavras, há também uma distinção, sutil e delicada, que nos une e nos transforma em coautores. Há poesia em seu texto. O tema é pandemia, doença, tecnologia, confinamento, metaverso, ausências, avatares. Quando ele começa falando de seus pais, da cidade onde nasceu, nas Antas, e da primeira viagem que fez, aos três meses de idade, ao lado do seu “irmãozinho” querido, do Porto à Galícia, imediatamente nos cativa e nos compromete com essa pequena odisseia original, levados e embalados por seu estilo, pequena obra prima da arte de escrever, do fazer literário, tão caro e tão raro nesses dias de hoje, efêmeros e frios e fugazes.

Sobre os meios, e os modos, lembremo-nos que o escritor e o leitor são ambos autores da mesma obra. E, mais, sócios e sósias: um não existe sem o outro. Há sempre um diálogo na escrita, e também na leitura. A mensagem será sempre em mão dupla, e aí está uma riqueza. Quem quer, pretensioso, dizer tudo, diz tudo mas diz pouco, porque considera o outro - o leitor - apenas um mero destinatário. Não sabe ele que, nessa hipótese, age como simples remetente. Porque há sempre dois mundos, o meu e o seu, e dois sujeitos, eu e você, e dois textos, e dois contextos, muitos excertos, muitos olhares... Quando você enxerga, dentro do que eu disse, o que eu quis dizer e, ainda dentro do que eu disse, o que não disse, completa-se, assim, o fascínio e o mistério da criação.

Posso dizer ainda, e por fim, que Joe Santos não nos revela o que pensa. Não o faz pela epifania, talvez um outro nome da serendipidade menor. Quando fala do amor, e dos pais, e do irmãozinho, vai aos poucos desvelando o que está velado, porque desvelar é, além do zelodesvelo. Dizê-lo assim, com domínio técnico, e fazê-lo assim, com arte, nos comove, porque enfim compreendemos que desvelar é também descobrir, mostrar-se, descobrir-se, retirar o véu daquilo que se nos oculta aos olhos: talvez hoje, nesses dias cinzentos, um véu de indiferença, de desvalor, de torpor, de pátina, de pó, com que os homens se cobrem, e se velam, enquanto correm desvalidos para um desconhecido shangri-lá. Alheados de si mesmos, esquecidos de viver... Quem os pôs em tal estado?  Talvez Bocage nos pudesse esclarecer. Steve Jobs uma vez nos disse que a jornada é a recompensa. Sobre a importância da viagem, da jornada e do lugar, é melhor perguntar a Joe Santos. “Viajar para o exterior nos proporcionava experiências e coisas que não podíamos ter ou encontrar em casa. Eu nunca parei de viajar. Estar em um país diferente fazia toda a diferença. Mais tarde, percebi que a diferença estava no conhecimento. Viajar é a maneira de vislumbrar o conhecimento único que cada lugar contém. A única maneira”.

08.08.2024   

1 Joe Santos é autor do livro From Global to Metanational: How Companies Win in the Knowledge Economy, em coautoria com Yves Doz e Peter Williamson, publicado por Harvard Business School Press em 2001. Fui seu aluno em 2003, no INSEAD, durante o curso de extensão “Gestão Estratégica para dirigentes empresariais”, exclusivo para a CNI-Confederação Nacional da Industria/Instituto Euvaldo Lodi. Em maio de 2024 estive no Porto com Joe e Nininha, e Perpétua, quando nos mostrou a casa onde nasceu, sua primeira escola, onde viu Nininha pela primeira vez, e mais outras algumas dessas pequenas coisas que, de Paulo Afonso a Rimini, bufões e calceteiros usam para pavimentar a estrada da vida.

Viagem, a diferença que importa.

José Santos

Março de 2021. Um ano inteiro no mesmo país, uma novidade absoluta para mim. Uma novidade que eu nunca quis. Não me lembro de não viajar para o exterior. A memória mais antiga que posso recordar é de mim sentado com meu irmãozinho no banco de trás do nosso Opel Olympia, viajando do Porto para a Galícia. Meus pais me disseram que eu tinha três meses de idade quando fui lá pela primeira vez. Eles adoravam viajar e nos levavam a todos os lugares que iam. Quando terminei o ensino médio, eu conhecia a maior parte da Europa Ocidental e falava quatro idiomas fluentemente. Naquela época, isso era muito raro. Era caro e cansativo também. Mas foi inestimável. Aprendi rapidamente que viajar para o exterior nos proporcionava experiências e coisas que não podíamos ter ou encontrar em casa. Eu nunca parei de viajar. Estar em um país diferente fazia toda a diferença.

Mais tarde, percebi que a diferença estava no conhecimento. Viajar é a maneira de vislumbrar o
conhecimento único que cada lugar contém. A única maneira.

Existe uma crença crescente de que a tecnologia digital será um substituto para a viagem. Mais especificamente, que a videoconferência e outras aplicações da tecnologia digital são um substituto para viagens de negócios. Eu não compartilho essas crenças. Claro, eu posso parcialmente sentir um local distante do meu quarto, desfrutar de uma reunião mediada por tecnologia com pessoas de lá, realizar uma atividade mediada por tecnologia remotamente, e meu avatar pode ir e interagir com avatares locais em qualquer lugar em algum metaverso. Tudo isso pode ser maravilhoso, mas não é viagem.
A tecnologia digital amplia a extensão da nossa imaginação. Mas imaginação não é viagem. Viajar é fazer a jornada.

Viajar é experimentar o esforço da jornada física, a travessia que nos prepara para entrar e sentir um lugar que nos é estranho exatamente porque não podemos compreendê-lo à distância.

Sem nossa experiência sensorial completa de um lugar, não podemos conhecê-lo nem aceder ao conhecimento incomum que ele guarda para nós.

A pandemia de Covid-19 aumentou dramaticamente o desenvolvimento e a difusão da tecnologia digital ao redor do mundo, que já acontecia há décadas. Essa difusão já estava transformando a globalização em uma nova forma que amplia nossa capacidade de aproveitar o mundo para nosso benefício local como nunca. Informações e ideias de qualquer lugar podiam ser acedidas em qualquer outro lugar, quase instantaneamente. Não precisamos mais viajar para isso.

Por exemplo, não há necessidade de viajar para analisar como foi o último trimestre de negócio, aparecendo em algum aeroporto ou na sala de reuniões de um hotel, apenas para pegar o próximo voo. Existem algumas barreiras para esse fluxo de dados em partes do mundo, mas não é por isso que continuaremos a viajar. Somos seres locais. Prosperamos com o que está acontecendo ao nosso redor, não longe.

Nossos sentidos e emoções, nossos instintos e intuição, evoluíram ao longo de inúmeras gerações para serem eficazes ao sentir e interpretar o mundo próximo, aqui e agora. No entanto, apenas uma parte do que sabemos aqui e agora pode ser codificada, digitalizada, comunicada, armazenada, acedida e reutilizada lá e então, em inúmeros lugares e ocasiões. Conhecimento científico, para começar. Não
precisamos mais viajar para aceder a toda a matemática e física que existem. O conhecimento científico novo é criado combinando o conhecimento científico existente.

Também não precisamos viajar para isso. Mas a maior parte do que sabemos não é codificável nem universal como STEM. Não pode ser digitalizada. É particular de um lugar - e mantida lá.

Um 'lugar' não é apenas um fragmento estável de um espaço uniforme. É um todo situado, complexo, dinâmico, feito do espaço físico diferenciado em sua localização e tudo o que está nele, nós incluídos, bem como a interação com tudo o que está ao redor, seu passado e seu futuro.

Cada lugar é uma emergência, única e insubstituível. Cada lugar contém o conhecimento específico que o define, implícito e imóvel. Conhecimento cultural, para começar. Política local, artes locais, costumes locais, habilidades locais, preferências locais e, principalmente, maneiras locais de aprender e produzir esse conhecimento local ao longo do tempo - todos moldados pelo, e moldando o ambiente local, as pessoas e a história. Conhecimento que os locais nem sabem que possuem. A tecnologia digital não pode lidar com esse conhecimento confuso e pegajoso. É por isso que sempre precisaremos viajar.

Viajar continuará mudando. As viagens de negócios, por exemplo, serão mais deliberadas, mais intensas, provavelmente ocorrerão com menos frequência, mas com estadias mais longas. Tempo suficiente para experimentar o lugar, interagir com as pessoas de lá, permitindo encontros fortuitos e a serendipidade acontecer. Mas viajar, mesmo assim. Caso contrário, não conseguiremos trabalhar juntos sem estarmos juntos.

Porque viajar faz a diferença que importa.

(Texto original em inglês, publicado em https://appraisalatpresent.com/ , 2021)
 

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Carpe Diem!
Edson Mendes de Araujo Lima, MSc
ESCOLA DE NEGÓCIOS, ARTES E OFÍCIOS
Coaching - Formação de Líderes - Formação de Educadores
(81) 9.8105.1952

http://lattes.cnpq.br/5372297864391019




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2 comentários


F. Nery Jr.

10/08/2024 - 10:36:14

Vamos ficar com Niemeyer? A beleza está na curva. Já imaginou uma mulher retilínea? Estirada toda reta? O encanto de dirigir está nas curvas da estrada. E a beleza, os encantos - e os segredos!] do lugar?! A minha satisfação quando viajo é [simplesmente] estar no lugar.


Professor Galdino

07/08/2024 - 23:56:40

Lê um e leva dois. É o que nos brinda o colega acadêmico da ALPA Edson Mendes estes ricos textos que nos manda. Um, de sua lavra e outro, de quem o inspirou. Um boa leitura em dose dupla! Abraço fraterno. Professor Galdino


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